Dia do Feminicídio dá visibilidade a histórias de vidas interrompidas Programação especial será realizada nos municípios paranaenses com o objetivo de conscientizar as mulheres sobre a violência doméstica.

19/07/2019 18h09 | por Nádia Fontana
De acordo com a Secretaria de Segurança Pública e da Administração Penitenciária do Estado (SESP-PR) em 2017 foram registrados 41 feminicídios e, em 2018, ocorreram 61 casos no Paraná.

De acordo com a Secretaria de Segurança Pública e da Administração Penitenciária do Estado (SESP-PR) em 2017 foram registrados 41 feminicídios e, em 2018, ocorreram 61 casos no Paraná.Créditos: Arte: Caio Budel

De acordo com a Secretaria de Segurança Pública e da Administração Penitenciária do Estado (SESP-PR) em 2017 foram registrados 41 feminicídios e, em 2018, ocorreram 61 casos no Paraná.

“Matou? Matou por quê?” Quando a vítima é uma mulher assassinada pelo marido, namorado ou companheiro, geralmente, a resposta está envolta num sentimento de posse, de pertencimento, que foi entremeado ao relacionamento amoroso, reflexo de valores profundamente arraigados na sociedade brasileira. Para debater essa triste realidade que ainda é a causa de centenas de mortes no Brasil, na próxima segunda-feira (22) – Dia de Combate ao Feminicídio no estado – acontece uma série de ações simultâneas em diversos municípios paranaenses. De acordo com a Secretaria de Segurança Pública e da Administração Penitenciária do Estado (SESP-PR) em 2017 foram registrados 41 feminicídios e, em 2018, ocorreram 61 casos no Paraná.

“Esta é a primeira vez que iremos realizar uma programação específica para essa data após a sanção da lei que implantou no Paraná o Dia de Combate ao Feminicídio. Por isso, está havendo uma mobilização estadual muito grande para que este momento não passe em branco e, também, para que a data integre o calendário oficial dos 399 municípios do estado”, afirmou a deputada Cristina Silvestri (PPS), procuradora Especial da Mulher da Assembleia Legislativa do Paraná (Alep). Ela é também a autora da Lei estadual nº 19.873/2019, que instituiu a data.

A parlamentar destacou que “as ações do dia 22 de julho são, efetivamente, as primeiras atividades da Procuradoria da Mulher da Alep, recém-instalada”. “Além de estarmos fazendo todo este trabalho de articulação com os municípios, iremos distribuir também um material impresso de conscientização voltado para as mulheres”, informou. “A ideia é que, com uma leitura rápida, elas consigam identificar se estão ou não em um relacionamento de risco”, frisou ainda Cristina Silvestri, que também é autora da lei do Botão do Pânico. Essa medida (Lei nº 18.868/2016) estabelece que as mulheres paranaenses em situação de risco ou de violência doméstica têm direito ao Dispositivo de Segurança Preventiva (DSP).

“Infelizmente os estudos de diversos marcadores indicam um aumento deste tipo de crime. Então mais do que nunca é importante que o poder público se envolva e incentive a conscientização sobre este bárbaro crime. A educação é o caminho que precisa ser seguido para que as mulheres consigam se libertar dos seus agressores e para que os homens se tornem menos violentos”, disse a parlamentar, ao comentar a instituição da data.

O dia de luta definido como “Dia D” é o 22 de julho em lembrança a data da morte da advogada guarapuavana Tatiane Spitzner, fato que ampliou, em todo o Brasil e até em outros países, o debate sobre a violência contra a mulher. Tatiane Spitzner foi encontrada morta após cair do prédio onde morava, em Guarapuava. Segundo laudo do Instituto Médico-Legal (IML) a morte da advogada foi causada por asfixia mecânica. O marido dela, Luis Felipe Manvailer, é acusado pelo Ministério Público (MP-PR) por feminicídio, cárcere privado e fraude processual e deve ir a júri popular.

Conscientização – Para marcar esse momento, a deputada Cristina Silvestri articulou uma série de atividades que serão realizadas simultaneamente em vários municípios paranaenses. O município que contará com mais ações é Guarapuava, justamente onde há quase um ano ocorreu a morte de Tatiane Spitzner. Nesta cidade, as ações serão realizadas pela Procuradoria da Mulher da Alep com o apoio de entidades como Secretaria Municipal de Políticas Públicas para as Mulheres, OAB Guarapuava, OAB Paraná, Associação Comercial e Empresarial de Guarapuava (ACIG), sociedade civil organizada, além de contar com o apoio da família Spitzner.

A programação em Guarapuava começará às 9h, no Centro da cidade, com panfletagem e divulgação dos serviços de atendimentos às mulheres em situação de violência. Também será realizada uma apresentação cultural sobre o tema. À noite, no Teatro Municipal, haverá exposições, apresentações culturais, palestra sobre o ciclo da violência doméstica e uma mesa redonda com especialistas para debater o feminicídio.

Caminhada – O deputado Goura (PDT), que integra a Comissão dos Direitos Humanos e da Cidadania da Alep, está convocando os paranaenses a integrarem essa luta contra o feminicídio, e faz um convite para a participação da série de ações de conscientização sobre o tema que ocorrem na segunda-feira (22), na Região Metropolitana de Curitiba (RMC), promovidas pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de São José dos Pinhais. Neste município as manifestações serão realizadas das 11h30 às 13h30, na Rua XV de Novembro (em frente ao Museu Municipal). Em Pinhais, entre as 10h e as 11h, vai ocorrer uma caminhada com abordagem na Avenida Camilo di Lellis sentido Av. Iraí (na altura dos bancos); em Piraquara o evento será às 8h15, em frente à Prefeitura (Av. Getúlio Vargas, nº 1990); e em Fazenda Rio Grande, as atividades estão marcadas para acontecerem das 10h às 11h, na Praça da Prefeitura (Rua Jacarandá, nº 300).

Em outros municípios, como Curitiba, Londrina, Toledo, Apucarana, Maringá, Mangueirinha e Campina do Simão, também serão realizadas ações na mesma data. Entre as atividades estão previstas exposições, passeatas e a distribuição de materiais impressos. “Queremos garantir um dia de luta em que a sociedade e as instâncias públicas possam se reunir em torno de ações e de conferências de políticas de combate ao feminicídio”, disse a deputada Cristina Silvestri, durante uma reunião, em Curitiba, com gestoras municipais para alinhar ações sobre o tema.

Aumento – Os números divulgados por instituições que estudam a violência contra a mulher com o objetivo de estimular a implementação de políticas públicas, escondem dramas que destroem famílias, afetam toda a sociedade. No Atlas da Violência 2019, um documento elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), divulgado em junho, um dos tópicos da pesquisa foi dedicado à violência contra a mulher. Os dados indicam “que houve um crescimento dos homicídios femininos no Brasil em 2017, com cerca de 13 assassinatos por dia. Ao todo, 4.936 mulheres foram mortas, o maior número registrado desde 2007”.  “Verificamos crescimento expressivo de 30,7% no número de homicídios de mulheres no país durante a década em análise (2007-2017), assim como no último ano da série, que registrou aumento de 6,3% em relação ao anterior”, apontam os pesquisadores.

Essa situação é comprovada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Desde 2016, quando casos de feminicídios que chegam ao Poder Judiciário passaram a ser acompanhados pelo CNJ, a quantidade de processos no país só cresce. Em 2018, o aumento foi de 34% em relação a 2016, passando de 3.339 casos para 4.461, conforme estatísticas divulgadas pelo órgão em março deste ano.

Situação refletida também pelos dados da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), da Organização das Nações Unidas, que apontam que 40% de todos os assassinatos de mulheres registrados no Caribe e na América Latina ocorrem no Brasil. Isto significa que a cada dez feminicídios cometidos em 23 países da América Latina e Caribe em 2017, quatro ocorreram no Brasil. Naquele ano, ao menos 2.795 mulheres foram assassinadas na região. Desse total, 1.133 foram no Brasil.

Já informações apresentadas pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), em fevereiro deste ano, mostravam que no primeiro mês de 2019, haviam sido reportados 126 assassinatos de mulheres em razão de seu gênero e 67 tentativas. Esses relatos referem-se a casos registrados em apenas 159 cidades do país, localizadas em 26 diferentes estados do Brasil.

No Paraná – O feminicídio aumentou também no Paraná. De acordo com a Secretaria de Segurança Pública e da Administração Penitenciária do Estado (SESP-PR) em 2017 foram registrados 41 feminicídios e, em 2018, ocorreram 61 casos. Um estudo do CNJ intitulado “O Poder Judiciário na Aplicação da Lei Maria da Penha”, divulgado no ano passado, revela que a violência contra a mulher no Paraná é realidade preocupante. “Os estados com as maiores proporções de casos de feminicídio a cada cem mil mulheres residentes são: Rio Grande do Norte, Paraná, Amazonas e Mato Grosso”, informa o documento. O Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) foi o quinto tribunal brasileiro que registrou maior número de novos casos de violência doméstica contra a mulher em 2017, com um total de 32.441 processos.

Um outro levantamento mostra que foram instaurados pelo Ministério Público estadual (MP-PR), de 2015 até o dia 15 de março deste ano, 693 inquéritos policiais referentes a feminicídios e oferecidas 592 denúncias criminais ligadas a esse tipo de crime. Os dados são do Sistema PRO-MP, do MPPR, levantados pelo Nupige (Núcleo de Promoção da Igualdade de Gênero). Só na capital, no mesmo período, foram 73 inquéritos abertos e 56 denúncias propostas.

Casa dá apoio – Referência no atendimento às mulheres vítimas de violência, a Casa da Mulher Brasileira (CMB), instalada em Curitiba, já atendeu 34.500 mulheres, desde a sua instalação em junho de 2016. Isto significa que, diariamente, cerca de 30 mulheres – que sofriam algum tipo de violência, seja física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral – bateram à porta do local em busca de apoio. Ali, elas encontram serviços integrados e a possibilidade de se libertar do ciclo de violência. O local conta com um trabalho de acolhimento e apoio psicossocial (assistentes sociais e psicólogas), a Delegacia da Mulher, a Defensoria Pública, o Juizado de Violência Doméstica e Familiar, o Ministério Público, a Patrulha Maria da Penha, programas voltados à autonomia econômica das mulheres e brinquedoteca.  

Na opinião da coordenadora-geral da CMB, Sandra Praddo, poucas pessoas têm hoje um entendimento sobre o que é o feminicídio e a gravidade da violência enfrentada pelas mulheres. Segundo ela, há uma grande dificuldade para a própria mulher identificar quando está num relacionamento abusivo, que pode levar a uma situação de violência física. “Estudos mostram que num grupo de seis mulheres, três passam ou passarão por algum tipo de violência”, alerta Sandra. Por isso, diz que a iniciativa da instituição da criação do Dia de Combate ao Feminicídio é muito importante porque dá visibilidade à causa. Ela entende que a conscientização é fundamental para mudar essa realidade. “Com a divulgação as pessoas têm mais informações e podemos evitar que o pior aconteça”, observou.

Hoje, no estado, 58 processos de feminicídio estão em andamento: “A imensa maioria é de violência doméstica e familiar. São mortes praticadas por companheiros, por ex-companheiros, por pessoas com alguma relação de parentesco”, informou a promotora de Justiça Fernanda Motta Ribas, do Ministério Público do Paraná, que atua na Promotoria de Justiça de Enfrentamento à Violência Doméstica Contra a Mulher de Curitiba. Na opinião dela, é fundamental que as mulheres recebam apoio para romperem com o ciclo de violência doméstica. Por isso, entende que a instituição desse dia enfatiza a necessidade de se debater o assunto. “A data traz luz para o tema, é um emblema”, observa. A promotora lembrou que antes de março de 2015, quando foi sancionada a Lei do Feminicídio, os crimes praticados contra a mulher eram analisados de acordo com as normas estabelecidas pelo Código Penal.

“A Lei Maria da Penha trata da violência praticada contra a mulher dentro de casa, por seus familiares”, observou a delegada Eliete Kovaliuk, titular da Delegacia da Mulher. Para ela, essa lei é “um verdadeiro estatuto de cidadania da mulher” a partir do momento que trata de medidas protetivas e estabelece uma rede de apoio, por exemplo. A Lei n.º 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) estabeleceu que a violência doméstica e familiar pode se consubstanciar em qualquer ação ou omissão que gere situações de violência física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral contra a mulher. “Já o feminicídio é uma lei que inseriu no Código Penal, que qualificou o homicídio praticado contra a mulher pelo fato dela ser mulher”, acrescentou. A delegada frisa ainda que todas as situações de violência devem ser denunciadas através dos inúmeros canais oferecidos à população.

Punição – A Lei n.º 13.104/2015, conhecida como Lei do Feminicídio, surgiu no Brasil em decorrência da pressão popular, num momento em que se registrava no país 13 casos de assassinatos de mulheres todos os dias. O feminicídio é definido como o homicídio da mulher em razão da sua condição de gênero, envolvendo violência doméstica e familiar e menosprezo ou discriminação à condição de mulher, de acordo com o parágrafo 2‑A.

A legislação incluiu o assassinato de mulheres na lista de crimes hediondos (Lei n.º 8.072/1990), como já ocorre em casos de genocídio e latrocínio, cujas penas previstas pelo Código Penal são de 12 a 30 anos de reclusão. Assim, quando for caracterizado feminicídio, a punição parte de 12 anos de reclusão. Sendo crime hediondo, o regime inicial de cumprimento da pena é o fechado e somente pode haver progressão para um regime menos rigoroso quando for cumprido no mínimo 2/5 da pena, se o criminoso for primário, e de 3/5 se for reincidente.

Ligue 180 – A Central de Atendimento à Mulher em Situação de Violência – Ligue 180 – é um dos inúmeros canais que recebem denúncia de violência contra a mulher. Ele é um serviço de utilidade pública gratuito e confidencial (preserva o anonimato), coordenado pela Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH).

O Ligue 180 tem por objetivo receber denúncias de violência, reclamações sobre os serviços da rede de atendimento à mulher e de orientar as mulheres sobre seus direitos e sobre a legislação vigente, encaminhando-as para outros serviços quando necessário. A Central funciona 24 horas, todos os dias da semana, inclusive finais de semana e feriados, e pode ser acionada de qualquer lugar do Brasil. Todas as denúncias são enviadas aos órgãos competentes para as devidas providências. Um relatório divulgado pelo Governo federal revela que o Ligue 180, no primeiro semestre de 2018, realizou 523.339 atendimentos, dos quais 447.719 correspondem a disseminação de informações, 38.681 são registros de denúncias de violência contra a mulher e 34.158 são relatos de violência.

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