Garantir a segurança jurídica e o direito dos estados de se responsabilizarem pela distribuição final do gás natural canalizado. Essas são as conclusões da audiência pública “Competências Constitucionais dos Estados na Regulação da Infraestrutura do Gás Canalizado”, realizada pela Assembleia Legislativa do Paraná na manhã desta segunda-feira (14). O encontro, proposto pelos deputados Alexandre Curi (PSD), presidente da Casa de Leis; Hussein Bakri (PSD), líder do Governo; Fábio Oliveira (PODE), coordenador da Frente Parlamentar da Engenharia, Agronomia, Geociências e da Infraestrutura e Desenvolvimento Sustentável do Paraná; e Luiz Fernando Guerra (União), presidente da Comissão de Indústria, Comércio, Emprego e Renda, debateu uma recente resolução da Agência Nacional do Petróleo (ANP), que estabeleceu novas normas técnicas para classificar os gasodutos.
De acordo com parlamentares, técnicos e representantes do setor, a normativa da ANP provoca, na prática, a reclassificação de parte considerável dos gasodutos de distribuição de gás canalizado, que são regulamentados pelos estados, em gasodutos de transporte, submetidos à legislação federal. A alteração retiraria das unidades da Federação a responsabilidade pela distribuição do gás, criando problemas de gestão nas áreas fiscal e de infraestrutura, entre outras.
“O objetivo principal dessa discussão é manter um direito constitucional que os estados do Brasil têm de fazer a distribuição do gás em suas próprias unidades da Federação. O objetivo dessa reunião é apresentar, primeiramente, esse direito constitucional que o estado tem de realizar essa distribuição e apontar os riscos que essa ação da ANP pode trazer, como a insegurança jurídica e problemas financeiros que o nosso estado pode enfrentar. Ao trazer essa discussão à tona, queremos mostrar os problemas que essa ação totalmente descabida do Governo Federal pode causar”, afirma o deputado Fábio Oliveira.
Já para o deputado Luiz Fernando Guerra, a nova regulamentação da ANP pode causar graves prejuízos também para o desenvolvimento econômico do Paraná.
“Essa possibilidade real de o Governo Federal trazer para si a discussão da distribuição, justamente no momento em que o Paraná realizava uma análise de viabilidade por mesorregiões, causa bastante estranheza. Vejo que o momento é pertinente para que possamos ouvir os técnicos do setor e os players que organizam essa distribuição e canalização, para que o Estado se torne cada vez mais industrializado. Sabemos que, quando há um gás competitivo, há mais industrialização. Vimos o que aconteceu nos últimos anos no Estado do Paraná, especialmente na região dos Campos Gerais, que conta com a canalização do gás natural e tem atraído investimentos de grandes indústrias para a região”, destaca.
Autonomia estadual em risco
Para Eudis Furtado, diretor-presidente da concessionária Compagás, retirar a autonomia dos estados pode atrapalhar a expansão da rede de gasodutos e comprometer o crescimento econômico.
“Hoje debatemos o papel das distribuidoras e a importância da autonomia dos estados na definição dos projetos de expansão. Trata-se de um ativo estadual, e a ideia é que a distribuição de gás e a construção dos gasodutos sigam as potencialidades do estado, aproveitando o potencial definido por ele. Quando essa discussão passa a ser federal para parte desses gasodutos, podem-se perder oportunidades para os estados”, ressalta, questionando a mudança proposta pela Agência Nacional do Petróleo.
“A ANP propõe que os gasodutos sejam classificados por sua dimensão, em polegadas, além da pressão e da extensão. No entanto, a classificação dos gasodutos, se são de transporte ou de distribuição, deveria ser feita pela sua finalidade. Ou seja, se um gasoduto atende clientes finais, ele deveria ser considerado de distribuição, e não de transporte. Sendo de distribuição, ele seria um ativo do estado”, complementa.
O presidente-executivo da Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado (Abegás), Marcelo Mendonça, também questiona a nova norma da ANP e explica a importância do gás canalizado para a economia e o desenvolvimento.
“Hoje, o gás natural é o combustível da transição energética. Por isso, é importante que os estados olhem para a sua matriz energética, buscando a redução da pegada de carbono e o uso de combustíveis cada vez menos poluentes. Nesse sentido, é fundamental analisar o que está sendo proposto nessa regulamentação. Existe no Brasil uma diferença entre a regulação federal e a regulação estadual. Os estados têm a competência, atribuída no artigo 25, parágrafo segundo, da Constituição, de desenvolver o segmento da distribuição. Cabe ao estado avaliar o que é necessário para desenvolver sua matriz energética estadual e promover políticas públicas. Essa medida proposta, que promove uma expropriação dos ativos da esfera estadual para a esfera federal, pode interromper o desenvolvimento das redes e, por consequência, gerar prejuízos aos consumidores, que deixarão de usufruir do gás natural”, pondera.
A audiência pública contou ainda com a participação do deputado federal Toninho Wandscheer (PP), que afirmou que a bancada federal paranaense estará unida para lutar pela autonomia estadual neste setor. “A Constituição Federal de 1988 criou uma linha nítida: o transporte de gás natural é competência da União; o serviço local de gás canalizado é competência dos estados. Essa divisão não foi um acidente, mas uma forma de equilibrar o pacto federativo, distribuir responsabilidades e permitir que cada esfera de poder cuidasse do que realmente domina”, afirma, lembrando que os estados cumpriram seu papel na criação das redes de distribuição.
Vinícius Klein, procurador de Justiça do Estado do Paraná, destacou que a Procuradoria-Geral do Estado ingressou, em conjunto com outras unidades da Federação, com a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7862 contra a proposição da ANP.
Além deles, compuseram a mesa Rejane Maria Schirr Scolari, diretora de Regulação Econômica da Agência Reguladora do Paraná (Agepar); Roberta Guimarães, secretária-executiva do Consórcio de Integração Sul e Sudeste (Cosud); Rafael Lamastra, vice-presidente do Conselho de Administração da Abegás; Marcos Lopomo, diretor econômico-regulatório da Abegás; Thiago Olinda, coordenador de Gás, Biocombustíveis e Hidrogênio da Superintendência de Energia do Estado do Paraná (SUPEN); Fábio Germano, presidente do Sindilouças; e Carlos Eduardo Hammerschmidt, vice-presidente do Grupo Potencial.
AUDIÊNCIA PÚBLICA: "COMPETÊNCIAS CONSTITUCIONAIS DOS ESTADOS NA REGULAÇÃO DA INFRAESTRUTURA DO GÁS CANALIZADO"
Carregando fotos...