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Assembleia Legislativa debate ampliação da advocacia dativa para proteger mulheres vítimas de violência

Evento foi uma iniciativa da deputada Ana Júlia (PT) e do deputado Gugu Bueno (PSD).

Audiência ocorreu no Plenarinho da Assembleia Legislativa na noite desta segunda-feira (17).
Audiência ocorreu no Plenarinho da Assembleia Legislativa na noite desta segunda-feira (17). Créditos: Orlando Kissner/Alep

A Assembleia Legislativa do Paraná realizou, nesta segunda-feira (17), uma audiência pública para discutir “A Atuação da Advocacia Dativa Envolvendo a Proteção da Mulher Vítima de Violência”, iniciativa dos deputados Ana Júlia (PT) e do primeiro-secretário, Gugu Bueno (PSD). O encontro reuniu representantes do Judiciário, da Defensoria Pública, da OAB e de entidades ligadas ao enfrentamento da violência doméstica, com foco na construção de um projeto de lei que garanta assistência jurídica gratuita, especializada e célere às paranaenses que buscam medidas protetivas ou precisam denunciar agressões.

A deputada Ana Júlia, propositora da audiência, destacou que a Lei Maria da Penha assegura atendimento jurídico gratuito às mulheres, mas que o Estado ainda não consegue ofertar esse suporte de forma plena e ágil.

“Infelizmente, muitas vezes não conseguimos fornecer essa assistência de maneira gratuita e célere, porque a demanda é muito grande e a Defensoria Pública não dá conta de tudo”, afirmou. Segundo ela, enquanto novos concursos e estruturações não ocorrem, uma alternativa concreta é permitir que a assistência jurídica seja prestada também por meio da advocacia dativa.

Atualmente, explicou a deputada, o serviço dativo é acionado majoritariamente para defender réus sem condições financeiras. A proposta discutida hoje busca ampliar esse alcance, permitindo que advogados dativos acompanhem mulheres vítimas de violência desde a fase administrativa.

“É um projeto que oferece assistência jurídica gratuita às vítimas e também cria oportunidades de trabalho para advogados que talvez nunca atuariam nesses casos”, completou.

A presidente da Comissão da Advocacia Dativa da OAB Paraná, Fernanda Weber, reforçou que o Estado já possui base legal para nomeações dativas — prevista na Lei Estadual 8.664/2015 — inclusive para vítimas e partes hipossuficientes, embora sem especificidade para mulheres. “Já existe nomeação judicial para vítimas de violência no Paraná. O que precisamos agora é operacionalizar, garantir que essas mulheres sejam acompanhadas do início ao fim das circunstâncias que decorrem da violência”, disse.

A primeira subdefensora pública-geral do Estado, Lívia Salomão Silva, enfatizou a necessidade de planejamento conjunto para que um eventual projeto de lei seja viável. Ela apresentou números que mostram a dimensão financeira da proposta: “São cerca de 80 mil boletins de ocorrência por violência doméstica no Paraná. Se o atendimento dativo seguir o valor tabelado de R$ 300, isso geraria um impacto de aproximadamente R$ 24 milhões. Se cada caso virar processo judicial, o custo pode chegar a R$ 40 milhões”, afirmou.
Lívia alertou que é imprescindível um diálogo com a Secretaria da Fazenda e a definição de um plano concreto de operacionalização antes da formalização legislativa.

Alana Marquezine, advogada e membra da Comissão de Enfrentamento à Violência de Gênero (CEVIGE) da OAB de Maringá, levou a sugestão do projeto à deputada. “A maior demanda que víamos era a de que essas mulheres não tinham acesso à ampla defesa. Por isso resolvemos criar e apresentar esse projeto à deputada Ana Júlia. Espero que a gente o construa para garantir esse atendimento efetivo às mulheres.”

“Precisamos ter essa efetividade como pilar. A vulnerabilidade técnica pode ser suplementada com os dativos e garantir a efetividade do atendimento. Isso é um benefício a todo o sistema, pois quando temos um registro de ocorrência falho, isso enfraquece todo o sistema de Justiça. O inquérito chega pior instruído, o Ministério Público trabalha com menos elementos. Esperamos que continuemos trabalhando todas juntas para que as mulheres paranaenses tenham uma assistência digna, como merecem”, comentou a advogada e escritora Marina Jonsson.

Números alarmantes

Carla Aguiar, assistente social e servidora da Secretaria de Saúde do Paraná, destacou a gravidade do problema no estado. “Os números no Paraná são alarmantes. Em 2024, 109 mulheres foram vítimas de feminicídio. Foram mais de 244 mil casos de violência contra mulheres e, destes, 73 mil de violência doméstica e familiar. Precisamos dar a atenção devida. Muitas mulheres enfrentam uma barreira quase intransponível, que é o atendimento jurídico rápido e especializado. Esse atendimento, principalmente no momento crítico da violência, é a diferença entre ela continuar ou ser interrompida. Por isso, o atendimento dativo é um grande complemento.”

A delegada Luciana de Novaes, chefe da Divisão de Polícia Especializada e conselheira titular do Conselho Estadual da Mulher do Paraná, participou do evento. Ela elogiou a iniciativa e citou exemplos de sucesso na Polícia Civil, como as 21 Delegacias da Mulher no estado. “A delegacia é uma porta de entrada da maioria das denúncias, e por isso tentamos concentrar na primeira oitiva toda a situação. Mesmo que façamos um trabalho detalhado e demorado, sem a assistência jurídica o atendimento acaba ficando incompleto. Porque não é somente a questão da violência; é o atendimento da família da mulher, com os problemas econômicos, guarda dos filhos, entre outros”, disse. “Eu acho muito bom o projeto, mas concordo que precisamos discuti-lo com a Secretaria da Fazenda”, complementou.

Outras participantes

Representando o Tribunal de Justiça do Paraná, a desembargadora substituta Fernanda Karam de Chueiri Sanches, da 12ª Câmara, destacou que a Lei Maria da Penha inaugurou um novo paradigma ao reconhecer a necessidade de suporte jurídico para a vítima durante todo o processo.

“É essencial que a mulher tenha alguém olhando por ela nas audiências, explicando o que está acontecendo, auxiliando na produção de provas e dando suporte emocional e técnico num momento tão sensível”, disse.

Para a magistrada, a Assembleia Legislativa dá um passo muito importante ao trazer o tema ao centro do debate público, especialmente diante da atuação complementar entre advocacia dativa e Defensoria Pública.

Letícia Parucker, vice-presidente da CEVIGE da OAB/PR, destacou que a advocacia dativa é uma complementação à Defensoria Pública, jamais uma substituição. “Apesar de avançarmos muito, foi necessário até criar uma nova Câmara para atender casos de violência doméstica. A advocacia dativa viria para somar.”

Marilena Winter, procuradora municipal de Curitiba e conselheira federal da OAB/PR, enalteceu a importância do debate. “Já temos um programa consolidado há 10 anos, com mais de 20 mil advogados dativos inscritos, com transparência e orçamento. No entanto, precisamos continuar debatendo e buscando a cooperação entre poderes, sentando todos juntos para colocar o Paraná em uma posição exemplar no combate à violência contra a mulher.”

“Quando uma mulher decide denunciar, ela já venceu barreiras emocionais, sociais e econômicas. No entanto, muitas vezes ela chega sozinha e sem orientação jurídica, diferente do agressor, que muitas vezes tem advogado garantido. Isso é uma desigualdade institucional que também precisa ser combatida”, comentou Ivanete Paulino Xavier, vice-presidente do Conselho Estadual dos Direitos da Mulher.

Participaram também Roberta Onish, vice-presidente da Comissão das Mulheres Advogadas, que destacou a união da classe no enfrentamento à violência de gênero, e Flavia Costa Gosh, integrante da coordenação das Promotoras Legais Populares, que ressaltou que o atendimento especializado e emergencial é fundamental para proteger o direito à vida e o acesso à Justiça.

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