a Consciência Negra e a Superação dos Preconceitos

22/11/2005 09h19 | por Luciana Rafagnin
A CONSCIÊNCIA NEGRA E A SUPERAÇÃO DOS PRECONCEITOSDiscurso da deputada estadual Luciana Rafagnin *, proferido em sessão solene, no dia 21/11/2005. Na foto, a deputada Luciana e o cônsul do senegal, Ozeil de Moura Santos, homenageiam a senhora Marina Gonçalves da Silva.Esta sessão solene, comemorativa ao dia da consciência negra e aos 310 anos de imortalidade do líder Zumbi dos Palmares é mais do que uma merecida comemoração no calendário oficial brasileiro. É também um convite coletivo à reflexão.As dívidas social, econômica e cultural que este país tem com para com a sua população de afro-descendentes ainda é imensa. São cerca de 500 anos de uma relação desleal, baseada em regras e critérios injustos e na quase completa falta de equilíbrio. Muitas das conquistas foram obtidas com muito sofrimento, muita dor, sacrifícios e com muita luta. O que não é diferente, até hoje, do que vivem algumas ditas “minorias”, como os pequenos agricultores, as famílias sem-terra, as populações indígenas, reduzidas como as nossas florestas ao que são pela exploração gananciosa, além de outras tantas “maiorias”, de pobres e de mulheres, por exemplo. O dia 20 de novembro, marca também a reflexão e a luta contra o preconceito, uma vez que é este preconceito que se encontra no centro de todas as formas de exclusão e de dominação em nossa sociedade.Nos últimos dias, uma notícia me chamou a atenção para fatos que ilustram o quanto o preconceito contra a nossa imensa população brasileira de afro-descendentes ainda está impregnado em nossa cultura e o quanto cruel é a sua perseverança. Segundo estudos do IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada — em parceria com o Unifem – que é o Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher -, os negros são a maioria dos pobres no Brasil, ou seja, 43% da população negra encontra-se abaixo da linha da pobreza. E 19% dos negros brasileiros recebem menos de um quarto do salário mínimo por mês. Nessa exclusão, as mulheres negras são as maiores vítimas. Em todas as áreas analisadas, como educação, mercado de trabalho, acesso a bens e serviços, as mulheres negras ficam com os piores indicadores, recebendo salários 30% menores que os de homens brancos para o desempenho das mesmas funções. E quanto aos índices de desemprego, foi constatado que ele é duas vezes maior entre elas também. O estudo apontou,ainda, que a população negra no Brasil é a maior vítima da violência, como um resultado direto de toda essa situação relatada. Um estudo da ONU não fica para trás: ele mediu o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) dos países do mundo e colocou o Brasil em 73º lugar. Mas quando se trata do Brasil Negro, ele cai para a 105ª colocação.Senhores e senhoras presentes, nobres colegas deputadas e deputados, eu não vou me deter muito sobre esses números horríveis, mas que são reais, embora eles sirvam para validar e engrandecer as lutas e as ações que são feitas para se corrigir uma desigualdade histórica absurda.Quando o Presidente Lula criou a Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), ligada diretamente à Presidência da República, ele tomou a decisão séria e acertada de começar a dar um basta institucional a essa desigualdade. O trabalho que a ministra Matilde Ribeiro vem realizando é voltado para a superação cotidiana do racismo e do machismo e para o reconhecimento de que o Brasil é uma nação que tem 50% de sua população negra, responsável pela construção desse país e pela nossa identidade como povo.A criação da secretaria especial, com status de ministério, foi só um passo no sentido de minimizar as conseqüências desses séculos. Pensando que essa superação do racismo tem um amparo na ignorância a respeito da riqueza da cultura negra e na falta de uma educação para a igualdade e identidade, o Presidente Lula voltou sua atenção para as escolas e passou a exigir, em uma das primeiras ações de seu governo, através da Lei 10.639 de 9 de janeiro de 2003, que se colocasse no currículo do ensino brasileiro o estudo dos conteúdos de História e Cultura Afro-Brasileira”. Dentro desse ensino para as mudanças sociais, cabem disciplinas como a história da África, a luta dos negros no Brasil, a cultura e o papel do negro na formação de nossa sociedade e a intenção de desmontar a visão predominante na educação oficial, que foi erguida sobre a condição da escravidão dos povos africanos e dos brasileiros afro-descendentes. Fazer esse resgate à luz da cidadania é fazer a leitura sobre o papel dos africanos na introdução de tecnologias agropecuárias e extrativas, como a única mão-de-obra especializada, no período colonial, para cultivar e beneficiar as matérias-primas nos diversos ciclos econômicos – madeira, cana-de-açúcar, borracha, café – e mesmo no ciclo do ouro, na sua extração e no seu trato; é reconhecer o legado social e antropológico da estruturação de uma família negra, matriarcal e festiva, firmada em laços de parentesco, bem como do candomblé e de sua religiosidade, baseados na oralidade, na ancestralidade e que, embora monoteísta, veio a se chocar com a tradição cristã ocidental, sendo, por essa razão, perseguida e discriminada.Um cenário maior se abre a essa discussão, quando se tenta visualizar a aplicação desses conteúdos nas disciplinas escolares. No ensino de Matemática, por exemplo, o professor terá de se remeter à origem dos princípios matemáticos e do raciocínio; ao período helenista, quando o reino da Grécia se estendia até Alexandria, no Egito; aos séculos 6 e 7 d.C, quando a região sub-saariana era local de profundo exercício de mercado, troca de especiarias, em relações estreitas com a Arábia e com o mundo oriental, que legaram, também, aos africanos o conhecimento nas áreas das ciências naturais.Na lingüística e na literatura, o educador dessa época de mudanças terá a oportunidade de viajar ao reino de Mali e à biblioteca de Tumbuctu, grande arsenal de conhecimento e desenvolvimento de idéias no século 9, destruída pelas Cruzadas, quando teve seu patrimônio deslocado, para a edificação das universidades européias. Sem contar a contribuição da cultura africana na formação de vocábulos da língua portuguesa ou o imenso legado à música popular brasileira.Ainda no ano de 2003, foi instituído por decreto presidencial o Grupo de Trabalho que vem avançando nas propostas para uma nova regulamentação ao reconhecimento, delimitação, demarcação, titulação e registro imobiliário das terras remanescentes de quilombolas e comunidades rurais negras, como é o caso, aqui no Paraná, da Invernada Paiol de Telha.Além disso, o Presidente Lula vem estreitando cada vez mais os laços das relações comerciais e culturais com os países africanos e coloca esses compromissos entre as prioridades das relações internacionais de seu governo, das rodadas de negociações globais, junto com a campanha mundial de combate à fome e à miséria.Estamos dando significativos e decisivos passos institucionais no sentido de superar o preconceito racial e o absurdo da discriminação. Porque sonhamos e buscamos uma sociedade realmente cidadã e justa, em que não há espaço para qualquer espécie de desigualdade ou intolerância.(*) LUCIANA GUZELLA RAFAGNIN é deputada estadual (PT) e presidente da Comissão de Agricultura, Indústria, Comércio, Turismo e Mercosul da Assembléia Legislativa do Paraná. Este artigo reproduz o discurso proferido pela deputada durante a sessão solene realizada na Casa, no dia 21/11/2005, em homenagem ao Dia da Consciência Negra e aos 310 anos de imortalidade do líder Zumbi dos Palmares.Informações: Thea Tavares3350-4087

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