Nova Mesa Executiva, novos parlamentares eleitos, em uma renovação de quase 40% dos deputados. O ano de 2015 trouxe significativas inovações na Assembleia Legislativa do Paraná. Entre elas, a maior abertura da Casa para a participação da sociedade, sobretudo por meio da realização de audiências públicas, que se multiplicaram. “Antes mesmo de assumir, eu já tinha o desejo de que a população se aproximasse mais dos deputados e conhecesse de perto o nosso trabalho, que é intenso”, destacou presidente da Casa, deputado Ademar Traiano (PSDB), ao fazer uma análise retrospectiva do ano de 2015.
A audiência pública é um instrumento de participação popular garantido na própria Constituição de Federal, que parte do princípio de que o cidadão não precisa ou não deve ser um simples espectador passivo das ações do poder público. Antes pelo contrário. E esses encontros entre população, deputados e representantes do Governo do Estado, bateram recorde no ano que passou: foram 78 em 2015, contra 20 em 2014. Na maioria das vezes as audiências foram realizadas no Plenarinho da Assembleia e permitiram aos deputados debater com a população os mais variados temas, especialmente os que tinham relação com os projetos de lei em trâmite no Parlamento. Em uma delas, promovida pelo deputado Márcio Pacheco (PPL), foram convidados representantes da Secretaria de Estado da Segurança Pública, das Polícias Civil e Militar, do SICRIDE (braço da polícia específico para tratar do desaparecimento de crianças), com a finalidade de colher sugestões para aprimorar o projeto que criaria, mais tarde, um aplicativo de celular para facilitar a busca por pessoas desaparecidas no Paraná. “Durante a audiência explicamos o que iria representar o aplicativo para agilizar as buscas e também pudemos ouvir a opinião da polícia, que atua diretamente nessa procura”, afirmou Pacheco.
Outros debates de situações que poderiam gerar impactos à cidade, à vida das pessoas e ao meio ambiente também aconteceram em forma de audiências públicas ao longo de 2015. Uma discussão recente abordou a utilização do método “fracking” na exploração de gás de xisto. O método prevê a “extração de gás por fraturação hidráulica em larga escala”. Ambientalistas contrários ao seu uso usaram o espaço para argumentar que ele causa danos ao solo e pode contaminar os aquíferos. E foram dois os encontros promovidos pela Comissão de Ecologia e Meio Ambiente da Casa, que contaram com especialistas em solos e lençóis freáticos, além do Governo do Estado, para tratar do tema, considerando que o Paraná e, em especial, a região Sudoeste, tem gás em abundância no subsolo e ele pode ser transformado em asfalto e solventes, entre outros benefícios. “Temos que escolher se queremos continuar sendo o estado da agricultura ou, futuramente, do petróleo. Ouvindo as opiniões na audiência e depois de visitar a Argentina, que utiliza o método, chegamos à conclusão que precisamos pesquisar mais o assunto para só depois proibir ou liberar esse tipo de extração do gás aqui no Paraná”, sentenciou o presidente da Comissão, o deputado Rasca Rodrigues (PV).
Projetos e serviços já implementados no estado também foram tema de audiências públicas no Legislativo. Destaque para os projetos da Lei Orçamentária Anual (LOA) para 2016 e do Plano Plurianual (PPA) para o período 2016/2019, ambos do Poder Executivo. A iniciativa foi do deputado Professor Lemos (PT), que promoveu a audiência com o objetivo de aproximar a sociedade da discussão sobre o orçamento estadual. “Foi muito importante abrir o debate para a participação de toda a sociedade em um momento de decisão de como serão gastos os recursos arrecadados pelo governo nos próximos anos”, disse. Participaram desse encontro representantes de movimentos sociais e de entidades da sociedade, lideranças empresariais e sindicais. A Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), aprovada ainda no primeiro semestre deste ano, a LOA e o PPA formam o orçamento público do estado. A LOA e o PPA devem sempre ser votados pelos deputados antes do encerramento do ano legislativo.
E a população veio – Média de público por audiência: 70 convidados, ou seja, quase cinco mil pessoas ao longo de 2015. “Acho que foi um novo momento da Assembleia ter me convidado para contar minha história e falar sobre o trabalho que faço lutando para que o Estado forneça mais testes para detectar as doenças raras o quanto antes”, disse Linda Franco, durante a audiência sobre doenças raras promovida em maio pela deputada Maria Victória (PP). Linda é mãe de um menino de doze anos, que há seis sofre com a adrenoleucodistrofia, também conhecida como Doença de Lourenço. Uma patologia genética rara e degenerativa que atinge o sistema nervoso. Ela contou que na época em que o filho foi diagnosticado, a doença só poderia ser detectada com exames nos Estados Unidos. A audiência serviu para que o público e os parlamentares entendessem o quanto é importante aumentar o número de doenças diagnosticadas com o teste do pezinho. Alguns meses depois, o tema virou um projeto de lei.
Grande parte desses encontros ocorreram pela manhã, com coordenação de um ou mais parlamentares, em conjunto com entidades da sociedade. Em muitos casos, as próprias entidades provocaram ou solicitaram a discussão. Assuntos polêmicos, muitas vezes, como a mudança nas regras para as eleições de diretores das escolas da rede estadual de ensino, que reuniu representantes da APP-Sindicato e da Secretaria de Estado da Educação. “Elas foram tão importantes que o projeto acabou sofrendo transformações positivas e que agradaram todos os lados”, lembrou o presidente da Comissão de Educação da Assembleia, deputado Hussein Bakri (PSC).
Como a palavra é dada aos cidadãos presentes, eles puderam se manifestar da forma que achavam mais conveniente. Na audiência promovida pela Comissão de Direitos Humanos e da Cidadania, em dezembro, para analisar a situação das famílias atingidas por barragens, houve protesto por meio de gritos de guerra e música com o slogan “Água e Energia Não São Mercadoria”.
Algumas das audiências provocaram comoção no público e nos próprios parlamentares, como a que apontou as dificuldades que as pessoas têm para obter o diagnóstico da doença celíaca, causada pela intolerância ao glúten – complexo de proteínas encontradas no trigo, centeio, cevada, aveia e subprodutos desses cereais – e a falta de políticas públicas para o seu enfrentamento.
O debate, uma iniciativa da deputada Claudia Pereira (PSC), teve a participação de especialistas, de representantes da Associação dos Celíacos do Paraná (ACELPAR) e diversos depoimentos de celíacos. Luciana Moura, de 32 anos, descobriu há apenas um ano que tem a doença. Muito emocionada, relatou as dificuldades enfrentadas desde criança, quando tinha todos os sintomas apresentados pelos celíacos, como diarreias crônicas, vômitos, dores abdominais, anemia, desnutrição e depressão. “Passei por dez gastroenterologistas, muitas internações e tratamentos, até finalmente receber o diagnóstico. Foram anos muito difíceis para mim”, relembrou aos prantos. Hoje ela aprendeu a conviver com o seu problema. É uma defensora ferrenha das campanhas de divulgação e esclarecimentos sobre a doença. “Precisamos muito de apoio”, disse.
Um gesto de apoio veio na mesma manhã, quando a deputada assinou um projeto de lei para inserir o Dia do Celíaco no Calendário Oficial de Eventos do Paraná, no terceiro domingo de maio. Data que hoje já é voltada a ações que alertam sobre a doença. O objetivo da iniciativa foi justamente estimular ainda mais a conscientização das pessoas sobre o assunto. “A falta de informações talvez seja o maior empecilho, a maior dificuldade dos celíacos”, afirmou Claudia Pereira.