Buscar uma solução que não traga prejuízos às empresas paranaenses e que também assegure os direitos dos consumidores. Esse é o compromisso assumido pelos deputados que participaram na manhã desta terça-feira (1º), na Assembleia Legislativa do Paraná (Alep), de uma audiência pública onde foi debatido o projeto de lei nº 594/2015, que pretende obrigar empresas a comunicar seus clientes inadimplentes de que serão negativados junto aos cadastros de proteção ao crédito, com correspondência enviada na modalidade de A.R. (Aviso de Recebimento).
A reunião, que lotou o Plenarinho, aconteceu por proposição do deputado Requião Filho (PMDB), presidente da Comissão de Defesa do Consumidor, em conjunto com o deputado Márcio Pauliki (PDT), presidente da Comissão da Indústria, Comércio, Emprego e Renda. “Entendemos que há divergências, que a proposta é polêmica e controversa. Por isso, decidimos chamar a sociedade civil a se manifestar”, disse Requião Filho. A mesma preocupação foi externada por Pauliki: “Precisamos construir uma proposta que seja boa para todos os paranaenses. Por isso, é importante esse debate, a mobilização das entidades”, assinalou.
Durante as discussões, que contaram com participações de representantes de associações comerciais, clubes de diretores lojistas, empresários e trabalhadores, o deputado Luiz Claudio Romanelli (PMDB), autor do projeto, explicou que a medida visa proteger os direitos do consumidor e não trazer prejuízos aos comerciantes. Ele informou que a proposta obriga órgãos de proteção como Serasa, SPC ou Seproc a fazerem análise da legitimidade do crédito e a notificarem os consumidores antes de incluí-los no cadastro de inadimplentes. “É um projeto que busca defender o direito do consumidor hipossuficiente frente ao poder de quem tem hoje a capacidade de negativá-lo e negar a ele o crédito. O que nós queremos é uma mudança, pois hoje esses serviços não fazem análise da legitimidade do crédito. Hoje a maioria das pessoas não recebe a carta do Serasa e só descobrem que foram negativadas quando já estão incluídas no cadastro negativo. Muitas vezes, paga-se o débito que é inexistente ou entra-se no juizado especial para poder cancelar o débito”, acrescentou.
Prejuízos – “Pedimos que esse projeto seja arquivado”, afirmou Guido Bresolin Junior, presidente da Federação das Federações Comerciais e Industriais do Estado do Paraná (FACIAP), que falou em nome da classe empresarial. Ele apresentou um vídeo onde a entidade faz um relato das possíveis consequências dessa medida para o setor: “As empresas não vão aguentar a inadimplência e quebrarão. E o consumidor pode se recusar a assinar esse A. R. Essa lei vai ampliar esse ambiente turbulento no qual já vivemos”, desabafou. Ele lembrou que hoje a notificação já vai por carta registrada, sem necessidade de assinatura do consumidor. Bresolin citou dados do estado de São Paulo, onde uma lei semelhante foi implantada, que mostram que a oferta de crédito recuou mais de R$ 800 milhões mensais, prejudicando o comércio e o consumidor.
Conforme o presidente da FACIAP, “72% das empresas que usam o SPC são micro e pequenas empresas e 65% das dívidas registradas são de até R$ 100,00. Registrar uma dívida com Aviso de Recebimento subirá de R$ 3,00 para algo próximo de R$ 20,00, um aumento de custos da ordem de 600%. Na maioria dos casos a empresa gastará cerca de 20% do valor da dívida apenas para registrá-la. Mesmo fazendo o registro, não haverá certeza de que a dívida será apresentada, pois o consumidor poderá não assinar o Aviso de Recebimento. Isso levará a uma queda vertiginosa na quantidade de dívidas incluídas, deixando o comércio às cegas na hora de vender a prazo”, alertou a FACIAP no vídeo.
“Como vou poder dar crédito a qualquer um se não souber se é um bom pagador? ”, questionou a presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de São Mateus do Sul, Ingrid Ulbrich. “Com essa lei vamos aumentar a inadimplência”, completou. “Queremos defender os consumidores que pagam as suas contas em dia, assim como os micros e pequenos empresários, que serão os mais prejudicados”, declarou Antonio Miguel Espolador Neto, presidente da Associação Comercial do Paraná (ACP).
Legislação – Já a advogada Claudia Silvano, diretora do Procon-PR, alertou sobre as situações enfrentadas pelos consumidores que são indevidamente incluídos no cadastro de devedores. “A pessoa negativada não consegue se movimentar no mercado e enfrenta grandes dificuldades para retirar seu nome desta lista”, disse. Também falaram durante a audiência os advogados Paulo Eduardo Pinheiro de Souza Bonilha, André Ramos Tavares e Tiago de Lima Almeida, que atuaram na defesa da lei em São Paulo. “Esse projeto complementa a norma geral estabelecida pelo Código de Defesa do Consumidor. Entendemos que no final a proposta será benéfica para todos”, garantiu Bonilha, que atua na Proteste, entidade de defesa do consumidor. Eles se manifestaram favoráveis à implementação de um novo sistema de comunicação, mais efetiva. Na opinião dos advogados, isso assegura ao consumidor a possibilidade de questionar a cobrança antes da inscrição de seu nome nos registros de proteção ao crédito. Informaram ainda ser corriqueiro o extravio e o não recebimento destas correspondências destinadas ao consumidor.
Projeto – O projeto do deputado Romanelli ainda não foi para votação em Plenário. Ele aguarda pareceres das comissões técnicas da Assembleia. Essa matéria define que as empresas devem esperar cinco dias a partir da devolução do aviso de recebimento assinado — pelo próprio consumidor ou por outra pessoa — para só então colocar o nome do cidadão no cadastro negativo, devendo também apresentar no ato documentos que comprovem o débito financeiro. O lançamento negativo somente poderá ocorrer depois de efetivada a notificação prévia, tendo o consumidor 15 dias para a quitação do débito ou apresentação de comprovante de pagamento. Em caso de comprovação pelo consumidor sobre a existência de erro, inexatidão, quitação ou inexistência do fato informado, a empresa será obrigada a retirar, no prazo máximo de cinco dias úteis, os dados cadastrais indevidos, independentemente de manifestação dos credores ou informantes.
No encerramento da audiência, o deputado Requião Filho disse que há necessidade de se criar um novo projeto que resolva o impasse dos consumidores negativados indevidamente, proteja o bom pagador e, principalmente, sem trazer qualquer prejuízo aos empresários. “Precisamos encontrar outro modelo que não este, adotado em São Paulo. Entendo que o projeto não foi escrito com más intenções, mas não soluciona um problema sem criar outro de proporções consideráveis. Deve haver outra saída para defender os consumidores, e só quem já passou pelo problema sabe o quão difícil é provar muitas vezes que não deve. Por outro lado, temos os empresários que enfrentam cargas tributárias altíssimas para manter o emprego da população e pagar impostos absurdos para manter os produtos à disposição no mercado. Entendam, este não é um combate partidário, nem pessoal, mas a favor das empresas do Paraná e dos nossos consumidores. Vamos buscar outra saída”, concluiu.
Também participaram da reunião os deputados Felipe Francischini (SD), Evandro Araújo (PSC), Nereu Moura (PMDB), Ademir Bier (PMDB), Guto Silva (PSC), Leonaldo Paranhos (PSC), Elio Rusch (DEM), Tercílio Turini (PPS), André Bueno (PDT) e Cobra Repórter (PSC).