Embate entre famílias do Sudoeste e Consórcio do Baixo Iguaçu volta à pauta em audiência pública Encontro aconteceu na manhã desta terça-feira (31) e reuniu famílias, MP, Defensoria Pública, lideranças locais e deputados que compõem a Comissão de Fiscalização da Assembleia Legislativa.

31/05/2022 14h33 | por Claudia Ribeiro

Créditos: Dálie Felberg/Alep

De um lado, o Consórcio Empreendedor Baixo Iguaçu, responsável pela operação da UHE Baixo Iguaçu, formado pela Geração Céu Azul, do Grupo Neoenergia e Copel. De outro, um grupo de cerca de 40 famílias afetadas pela construção da usina no ano de 2013, e que alegam que não tiveram os direitos reconhecidos, entre eles, a indenização devida e realocação. O embate, que já dura quase uma década, foi o tema de uma audiência pública da Comissão de Fiscalização e Assuntos Municipais da Assembleia Legislativa do Paraná, na manhã desta terça-feira (31). “Já realizamos diversas audiências com o IAT, Copel, tentativas de contato com os representantes do consórcio, sem sucesso. Porém, apesar dos relatórios dizerem que as famílias não têm direito, existem documentos que comprovam que famílias com situações semelhantes a estas, já receberam suas indenizações.  Então, por que elas não conseguem receber?”, questionou o deputado Artagão Júnior (PSD), vice-presidente da Comissão e proponente da audiência.  

O empreendimento fica na região Sudoeste do Paraná, no Rio Iguaçu, entre os municípios de Capanema e Capitão Leônidas Marques. Mas a área do reservatório também abrange os municípios de Planalto, Realeza e Nova Prata do Iguaçu. O imbróglio atinge famílias que vivem em todos eles. “Na época em que concedeu a licença ambiental, o Instituto Água e Terra (IAT), condicionou o documento ao bem-estar das famílias, e isso não aconteceu. O entendimento é que o órgão que tem a maior força de pressão para evitar a judicialização da questão, que pode levar anos, é o IAT”, justifica Artagão.

O problema é que no relatório produzido sob a coordenação do IAT e apresentado durante a audiência por Jean Carlos Helferich, gerente de licenciamento do Instituto, consta que a empresa julgou inelegível o caso de 34 famílias para remanejamento e realocação ou indenização. (Hoje já são 47 famílias). “A empresa alegou, entre outras falhas, que as famílias não atendiam aos critérios, como falta de documentação das terras”, explicou. Mesmo assim, ao longo do trabalho, o IAT fez vistorias, entre os anos de 2017 e 2018, quando observou violações de direitos, falta de diálogo entre empresa e famílias, divergências de informações, que dos 348 imóveis atingidos pela barragem, 43 ficaram para trás, inclusive com parecer da Procuradoria Geral do Estado. O resultado, segundo o gerente de licenciamento, foi a assinatura de um termo de acordo firmado em 2018, que foi amplamente discutido e aprovado, mas não é um documento que, necessariamente, atendia aos casos individualizados. “Não podemos admitir que o IAT aceite a posição da empresa e tudo fique como está. Um dos pedidos que faço aqui é de uma revisão neste relatório, porque a empresa se baseia nele para negar as indenizações. O IAT deve rever esse documento e a Copel, que é sócia nesse empreendimento, pode também ajudar. Reparar os danos causados aos atingidos”, solicitou o deputado Professor Lemos (PT).

Histórico

Em 2014, a Usina apresentou um acordo se comprometendo em deixar a população em uma situação confortável, mas parte do grupo alega que não foi o que aconteceu, porque ela não cumpriu com sua obrigação. Em 2016, ocorreu o Programa de Remanejamento Populacional, porém, o grupo afirma que as diretrizes e critérios não foram respeitados. Para eles, falta isonomia. Casos iguais com tratamento desigual. “Grande parte das famílias atingidas é de pequenos produtores, que tiveram perdas econômicas. O que queremos é a indenização das famílias, garantindo os direitos previstos no Plano e o reassentamento delas no caso do município de Capitão Leônidas Marques. Para isso, as nossas propostas são uma Ação Civil Pública; uma sindicância que a própria Assembleia pode abrir e a cassação do alvará da empresa”, indicou Valmir Lucetti, que representou a Comissão da Câmara Municipal de Capitão Leônidas Marques para analisar, apurar, emitir pareceres, fazer denúncias e buscar soluções junto ao Consórcio da Usina do Baixo Iguaçu. Essa Comissão foi formada em 2021.

O que diz a empresa

O Consórcio não mandou representantes e justificou a ausência alegando, por meio de nota, “que fez os levantamentos de forma criteriosa e que firmou o acordo em 2017 com o intuito de indenizar e remanejar as famílias para o reassentamento coletivo”. E segue: “protocolou no IAT em 2021, apresentando as evidências de remanejamento das famílias atendendo aos critérios do Instituto, onde possui licença comprovando que cumpriu todas as tratativas administrativas com as famílias”, além disso, “que apresentou novas evidências em relação às famílias que considera inelegíveis ao programa, em razão de já ter cumprido a obrigação com as famílias”. “Lamentamos a ausência de seus representantes na audiência, que considero uma falta de respeito com a população e com esta Casa, já que trata-se de um assunto de justiça social”, lamentaram   Artagão e o presidente da Comissão, o deputado Francisco Bührer (PSD). A Copel, que possui 30% do empreendimento, encaminhou uma nota, afirmando “que não participaria da audiência porque é minoritária nesse empreendimento”.

Participações

Rafael Machado Moura, promotor do Centro de Apoio aos Direitos Humanos do Ministério Público do Paraná, já atuou na Comarca de Capanema. Disse que o MP está atento, mas que já tem tomado providências importantes. Como por exemplo, em 2013, quando fez uma recomendação administrativa ao Consórcio e ao IAT da situação que envolvia violação de direitos humanos, e que não se tratava de uma questão meramente aritmética. “Era algo complexo que demandava uma atenção especial. Que se tratava de um deslocamento compulsório, que é quando uma comunidade inteira é removida de forma forçada. Chamamos de deslocamento forçado. Dessa forma, IAT e empresa deveriam assentar todas as famílias; e para fins de indenização, se levasse em conta não apenas o aspecto patrimonial, mas o dano moral, em função da perda da terra”, ressaltou, na época que era promotor na região.

Mesmo que boa parte dos casos tenham sido solucionados, sobraram essas cerca de 40 famílias e o MPE tentou reabrir as tentativas com o IAT na esfera administrativa. Porém, não era mais possível reconhecer os direitos administrativos dessas famílias. “Não podemos abrir ação, mas entramos em contato com os promotores da região, que estão analisando a situação das famílias. Como Ministério Público, posso dizer que a negativa apresentada pelos órgãos tem que ter respostas fundamentadas. Isso nós vamos acompanhar e retomar a ideia dos danos morais coletivos. Já que mexe com a dignidade de todo o grupo”, completou Moura.

João Victor Rozatti Longhi, defensor público, acrescenta que há uma clara violação de direitos humanos das famílias em questão. “Os danos que foram causados foram muito maiores que os benefícios trazidos a estas famílias. Quem perde sua terra, perde todo seu vínculo de pertencimento àquela terra. Estou trabalhando incessantemente em cada caso. Se foi tão boa a chegada desse empreendimento para a cidade, por que as pessoas atingidas não estão felizes? Por que meu vizinho recebeu indenização e eu não? Para a Defensoria é um abuso. O tema não foi tratado com respeito. Que tipo de critério foi respeitado para firmar o termo de acordo?”, indagou. “Estamos chegando à conclusão que houve abuso do direito por parte da usina. E vamos fazer o que for possível para defender essas famílias que ficaram para trás. Elas têm direito e nós vamos lutar até o último segundo para conseguir.  Vamos tentar pelas vias não judiciais, mas se não der, vamos às vias de fato sim”.

Outras presenças

Participaram ainda da audiência, prefeitos e vereadores das regiões afetadas, além de um grupo de famílias, que viajou mais de 500 quilômetros até Curitiba. “Acompanho, desde o início, as tratativas e está claro que houve má fé da empresa com os pequenos proprietários. Os grandes foram beneficiados e as famílias mais sofridas foram prejudicadas. É muito triste, injusto que essas pessoas precisem vir até aqui para cobrar um direito que foi negado a elas”, disse o deputado Nereu Moura (MDB).

A deputada Luciana Rafagnin (PT), que também representa a região, afirmou que, na época da construção da usina, o projeto passou pela Assembleia Legislativa. “Apresentamos uma emenda ao projeto de que a usina só poderia ser instalada com o pagamento de todas as indenizações, mas a emenda não passou. Infelizmente. Também há uma série de fatores que não foram levados em consideração, como por exemplo, acompanhar a situação das famílias, inclusive as que foram indenizadas. Na minha opinião, faltou diálogo entre a Neoenergia, a Copel e o Governo do Estado. Nenhuma dessas pessoas está pedindo nada, estão reivindicando seus direitos”.  “Houve perdas muito grandes para as famílias. Sabemos disso. Por isso, essa audiência é tão fundamental para mais uma vez pressionarmos a empresa e a Copel, detentora de 30% da hidrelétrica, para resolvermos esse imbróglio e que seja feita justiça a estas famílias que foram esquecidas”, afirmou o deputado Nelson Luersen (União), que também assinou a emenda, na época.

“É um absurdo essa situação. Participei de diversas audiências. Criamos uma Frente em Defesa dos Atingidos por Barragens. Fizemos um esforço grande aqui na Assembleia, mas uma parte das famílias foi prejudicada. O órgão de licenciamento ambiental precisa se posicionar e não aceitar o relatório da empresa sem questionar.  Reconsiderar o entendimento. Queremos a justificativa dessas famílias não terem recebido. Em nome da comissão, por que temos uma alteração de APP sem o conhecimento das famílias?”,  encaminhou Professor Lemos (PT), no final do debate.

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