
Os deputados estaduais Goura (PDT) e Professor Lemos (PT), juntamente com representantes da APP-Sindicato, do Observatório Nacional de Violência (ONVE) contra Educadores e Educadoras e da Universidade Federal do Paraná (UFPR), entregaram, na quarta-feira (2), ao Ministério Público do Paraná (MPPR), os encaminhamentos da audiência pública “Adoecimento de Servidores e Educadores da Rede Pública do Paraná”, realizada em 9 de junho.
No documento entregue ao procurador-geral, Francisco Zanicotti, constam, além dos encaminhamentos urgentes da audiência pública realizada na Assembleia Legislativa do Paraná, a contextualização do problema que atinge toda a rede estadual de educação.
São dados e informações diagnósticas sobre o adoecimento da categoria e sobre as denúncias de desmonte da gestão democrática, da privatização da educação e da imposição tecnológica sem base pedagógica, além dos marcos legais e políticas existentes ignoradas pela Secretaria Estadual de Educação (Seed).
“As denúncias reunidas indicam um ambiente de trabalho marcado por assédio institucional, presentismo forçado, perseguições políticas e criminalização do adoecimento”, afirmou Goura no documento entregue ao Ministério Público.
Recomendações ao Governo
Entre os encaminhamentos propostos ao MPPR estão a recomendação imediata ao Governo do Estado de suspender a obrigatoriedade do uso de plataformas digitais até avaliação de seus impactos.
Isso para garantir, conforme legislação, a criação de estruturas reais de apoio psicossocial; para proibir práticas de bonificação vinculadas à redução de licenças médicas; e para assegurar a autonomia pedagógica e a liberdade de cátedra dos educadores e educadoras.
A audiência pública, que foi proposta pelo deputado Goura, também definiu pela proposição de Termos de Ajustamento de Conduta (TAC) com a Seed para implementação efetiva de comitês de saúde mental nas escolas; para a retomada da gestão democrática escolar; e para acompanhamento independente sobre os impactos das plataformas digitais.
E também sugeriu a criação de um canal permanente do MPPR para receber denúncias de assédio e adoecimento de professores e professoras, com proteção contra retaliações.
Defesa e garantia de direitos
O deputado Goura ressaltou que uma das recomendações da audiência pública foi envolver o Ministério Público para reverter o quadro de desumanização e desvalorização do magistério e garantir o direito à saúde, à dignidade e à educação de qualidade. “Não estamos diante de casos isolados, mas de uma política pública estruturada que tem como efeito, e em muitos casos como objetivo, a desumanização e a desvalorização do magistério”, disse o deputado Goura.
Apoio do MPPR
O procurador-geral, Francisco Zanicotti, agradeceu a confiança no Ministério Público. Falou da importância dos dados apresentados para buscar a solução do problema e afirmou que o órgão está disposto a somar. “Quanto mais dados científicos a gente tiver para cobrar ações do governo, mais efetiva será nossa atuação”, afirmou.
Zanicotti citou que pesquisa recente revelou o acometimento da chamada “fadiga da compaixão”, que atinge justamente profissionais ligados ao atendimento direto e ao cuidado com as pessoas, como enfermeiros e enfermeiras, procuradores e procuradoras, professores e professoras, entre outros. “Ninguém cuida de ninguém se não cuidarmos de quem cuida”, ressaltou.
Escutar os relatos e encaminhar as denúncias
A advogada do ONVE e da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos da OAB Paraná, Lígia Ziggiotti, ressaltou que professores e professoras são sujeitos especialmente vulneráveis à violência e que, portanto, é preciso pensar em mecanismos de acolhimento e escuta, uma vez que faltam instituições e órgãos para receber os relatos e denúncias da categoria.
Nesse sentido, Ziggiotti disse acreditar “que o Ministério Público tem a capilaridade para receber essas denúncias”.
Durante sua participação na audiência pública do dia 9 de junho, ela ressaltou que, a partir de 2017, inúmeras casas parlamentares apresentaram, e em alguns casos conseguiram aprovar, projetos de leis que promovem a violência contra educadores e educadoras. “São Paulo e Paraná, inclusive, lideram o ranking de produção de projetos de leis para reduzir direitos de educadoras e educadores”, disse.
O Observatório é um projeto de extensão vinculado à Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense (UFF), que conta com a parceria do Ministério da Educação (MEC), e atua no campo da educação democrática e no enfrentamento ao cenário de múltiplas violências contra educadoras e educadores no Brasil.
Com base nos estudos e pesquisas, o Observatório parte da premissa de que há um processo de sofrimento e adoecimento dessa categoria causado por fatores como o assédio moral, tentativas de censura e outras formas de violências às quais ela vem sendo submetida.
Pesquisas
O professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Geraldo Balduíno, que orientou pesquisa sobre saúde mental dos e das docentes da educação básica pública paranaense, falou da importância dos dados científicos que mostram o adoecimento dos profissionais da educação.
Balduíno destacou a necessidade de se criar um espaço mais amplo, com participação de vários órgãos e instituições ligadas à educação, para pensar no desenvolvimento de futuras ações com base em dados científicos.
Segundo alguns dados apresentados, 65% dos professores/as apresentam sintomas de burnout; 57% pensam em abandonar a profissão; 47% afirmam que o trabalho afeta a saúde mental; e 68% relataram violência verbal, 53% psicológica e 22% física.
Pressão para aumentar Ideb
Segundo a presidente da APP-Sindicato, Walkiria Olegário Mazeto, a pressão sobre professores e professoras para reduzir o índice de reprovação e de evasão escolar é o principal problema. “O Paraná não está conseguindo melhorar a aprendizagem. A nota dos estudantes se mantém a mesma desde 2017. O que está alterando o índice do Ideb é o fluxo”, disse Walkiria.
“Para se ter uma ideia, em 2023, o Paraná aprovou 98% dos alunos”, completou, ao explicar que, além da aprendizagem, o índice de aprovação e a evasão escolar também entram na composição do índice do Ideb. “Todo esforço não é para melhorar a aprendizagem, é para não reprovar”, acrescentou Walkiria.
Plataformização da educação
Segundo o deputado Professor Lemos, a proposta implantada pelo ex-secretário Renato Feder e mantida pelo governador Ratinho Jr. utiliza as plataformas digitais como instrumentos de vigilância e controle, não de ensino.
“Isso está causando um adoecimento muito grande, na medida em que essas plataformas estão sendo usadas para fazer pressão. Agora existem os embaixadores e os tutores das plataformas digitais, que, junto com os chefes dos núcleos regionais, fazem a vigilância nas escolas e cobram resultados a qualquer custo”, disse.
Precarização das contratações
Segundo os dados apresentados, quase 50% dos professores são contratados via Processo Seletivo Simplificado (PSS), que não assegura os mesmos direitos que os concursados. Enquanto um professor concursado possui 25% de hora-atividade (que já é o mínimo previsto na legislação), o professor contratado possui apenas 10% de hora-atividade. E também não possuem os mesmos direitos ao atendimento à saúde e nem mesmo em relação aos direitos políticos.