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Professores e estudantes debatem falta de regramento e uso da IA nas salas de aula do Paraná

Oportunidades e prejuízos representados pela tecnologia ao ensino foram destacados durante audiência pública.

Audiência realizada no Plenarinho da Casa reuniu educadores, estudantes, pesquisadores, sindicatos, especialistas, representantes de instituições públicas e movimentos sociais.
Audiência realizada no Plenarinho da Casa reuniu educadores, estudantes, pesquisadores, sindicatos, especialistas, representantes de instituições públicas e movimentos sociais. Créditos: Orlando Kissner/Alep

Uma audiência pública realizada na manhã desta segunda-feira (25) reuniu professores, pesquisadores, parlamentares e estudantes para debater o uso da Inteligência Artificial (IA) nas escolas e universidades do Paraná. A aplicação da tecnologia na educação básica estadual, que ocorre ainda sem regulamentação definida, assim como os prejuízos e oportunidades que ela representa para o ensino, foram discutidos durante o evento, realizado no Plenarinho da Assembleia Legislativa do Paraná.

“Vivemos na educação um processo de plataformização que retira a autonomia dos professores e parte do direito à educação dos estudantes — da dúvida, do questionamento, da interação com o professor”, afirmou a deputada estadual Ana Júlia (PT). A parlamentar destacou que as reflexões e sugestões colhidas no evento serão consideradas na elaboração de projetos de lei sobre o tema. Ana é proponente e organizadora do encontro, juntamente com a deputada federal Carol Dartora (PT), integrante da Comissão de Educação da Câmara dos Deputados.

Carolina Israel, professora do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), abriu a discussão apresentando estudos que avaliam o impacto da inteligência artificial no desenvolvimento cognitivo dos estudantes. “Pessoas que a utilizam para produzir textos têm apresentado dificuldades na memorização de conceitos e no desenvolvimento intelectual”, alertou. “Comparadas a pessoas que não usaram IA, aquelas que usaram demonstraram menor atividade cognitiva e neurológica.”

Outro ponto destacado pela docente foi a crescente dificuldade de identificar a origem das informações entregues pela tecnologia. “[As IAs] são formuladas com base no que se chama de redes neurais artificiais, que consistem em uma série de camadas que funcionam simultaneamente e processam essas informações. E são tantas camadas que, hoje, nem mesmo quem projetou a tecnologia consegue identificar o fluxo que levou a determinada resposta”, explicou.

Legislação e plataformização

Em seguida, Dartora apresentou as proposições que tramitam no Congresso Nacional sobre o tema, incluindo a inserção de conteúdos como cibersegurança e IA nos currículos escolares e a formação continuada de educadores, entre outros pontos. De forma mais ampla, o PL 2338/2023 propõe um marco regulatório com diretrizes para o uso ético e responsável da inteligência artificial, com base na centralidade da pessoa humana.

“Com a falta de regulamentação, temos um cenário de insegurança legislativa para definir o que é permitido ou não na educação”, afirmou a parlamentar, que também é doutoranda em Tecnologia e Sociedade pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR). A situação coloca o Brasil em condição de atraso, já que países da Europa, a China e outras nações já estabeleceram legislações sobre o tema.

Apesar disso, a inserção da inteligência artificial nos currículos das escolas paranaenses tem avançado pelas mais diversas plataformas, ressaltou a professora Vanda Bandeira Santana, secretária educacional da Associação dos Professores do Paraná (APP-Sindicato). “É um processo de alienação. O produto vem pronto para as escolas, com os conteúdos previamente elaborados.” Para ela, é essencial garantir a autonomia dos professores no ensino. “[Hoje] somos reprodutores de um conteúdo cuja autoria desconhecemos.”

No ensino superior, a IA também traz desafios para assegurar a autenticidade dos trabalhos acadêmicos. “O principal desafio está na área de pesquisa. O fluxo de produção de artigos, a revisão por pares, envolve um trabalho intenso que, até então, era feito por seres humanos. E já há relatos tanto de submissões quanto de revisões realizadas por softwares de inteligência artificial”, afirmou Geraldo Augusto Pinto, doutor em Sociologia e professor da UTFPR.

Lucas Schneider, vice-presidente da União Paranaense dos Estudantes e estudante de Publicidade e Propaganda, abordou as disparidades tecnológicas entre os municípios do Paraná. “Precisamos pensar nas escolas que não têm acesso à internet. Talvez lá a inteligência artificial ainda não tenha chegado. E quanto tempo vai levar para chegar? Esse é o ponto mais crítico: não podemos permitir que a IA aumente a desigualdade.”

Gustavo Giménez Lugo, docente e pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Computação Aplicada da UTFPR, explicou o funcionamento da IA e como ela compila textos. “O mecanismo não traz novidades reais, como abstrações concretas, e desestimula a criação original. Você está matando a inovação se acredita que aquela geringonça traz inovação”, criticou.

Benefícios

O evento também abriu espaço para debater como aplicar a inteligência artificial de forma responsável, de modo a contribuir com o aprendizado. “Não podemos privar os jovens de uma ferramenta que vem para somar nas estruturas administrativas”, ponderou Giancarlo De França Aguiar, diretor-geral do Instituto Federal do Paraná (IFPR) Campus Curitiba. Durante a reformulação dos currículos da instituição, estão sendo incluídas disciplinas que abordam temas éticos e morais relacionados à IA, informou o gestor.

Antonio Eduardo Kloc, diretor da Agência de Inovação do IFPR, exemplificou como a tecnologia pode beneficiar a ciência quando bem utilizada. Ele citou a aplicação da IA preditiva — ramo que analisa dados estatísticos para identificar padrões e “prever” eventos — em uma pesquisa conduzida pelo IFPR sobre possibilidades de agressões na Região Metropolitana de Curitiba (RMC). O estudo se baseou em dados da Secretaria Estadual de Segurança Pública.

Nesse sentido, Dartora também destacou que a tecnologia pode facilitar a adaptação de conteúdos ao ritmo de cada estudante, automatizar tarefas burocráticas — liberando mais tempo para o professor se dedicar ao ensino — e ampliar a acessibilidade por meio da tradução em Libras para estudantes com deficiência, entre outros benefícios.

Estudantes

Alunos do Instituto Federal do Paraná (IFPR) e da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) acompanharam a discussão no Plenarinho e apresentaram questionamentos ao final da audiência pública. Rodrigo Silvino, aluno do 3º ano do ensino médio integrado ao curso técnico em Programação de Jogos Digitais do IFPR, contou que utiliza a IA para pesquisas e resumos de textos.

“Acho interessante para conhecer códigos de programação ou buscar informações”, disse. “Toda tecnologia nova precisa ser regulamentada para garantir segurança ao cidadão. Mas tenho receio, porque a regulamentação pode limitar o acesso a certos tipos de IA. Acredito que o ideal seja ensinar as pessoas a usar a tecnologia, regulamentando, por exemplo, as ferramentas de produção de imagem e vídeo.”

“Vejo alunos abusando da IA para conseguir vantagens dentro da sala de aula e fazer as tarefas mais rapidamente”, opinou Artur Zanella dos Santos, também estudante de Programação de Jogos Digitais. “Acredito que isso é um erro, já que, muitas vezes, a inteligência artificial utiliza fontes questionáveis. Isso prejudica efetivamente o aprendizado do aluno, especialmente nos primeiros anos.”

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