Pelos corredores da Assembleia Legislativa do Paraná (ALEP) passaram nesta quinta-feira (21), durante a sessão solene de homenagem de 100 anos de existência do Hospital Pequeno Príncipe, muitas histórias ligadas à instituição. Algumas tristes, mas muitas mais de esperança. O próprio propositor da homenagem, deputado Michele Caputo (PSDB), tem uma em sua memória.
Secretário municipal e estadual de Saúde por muitos anos, ajudou uma vizinha que precisava de auxílio. “Como secretário, tenho muitos relatos ligados ao Pequeno Príncipe, mas um me marcou. Uma vizinha de condomínio bateu de madrugada na minha casa com o filho, que tem síndrome de down, passando mal. Não tive dúvidas: Vamos ao Pequeno Príncipe”, relata. “Lá, não precisei me apresentar. Ninguém precisa. O atendimento primoroso, com agilidade e competência, salvou aquela criança”, conta.
Um novo olhar – Já Tatiana Forte cresceu no Pequeno Príncipe. A mãe dela, Ety Gonçalves Fortes, é presidente voluntária da Associação Hospitalar de Proteção à Infância Dr. Raul Carneiro. Desde os quatro anos de idade, Tatiana percorre os corredores do hospital com a mãe. “Lembro-me de brincar com as crianças internadas”, diz. Das brincadeiras de infância, Tatiana cresceu, estudou psicologia e voltou ao Pequeno Príncipe para um estágio. Acabou ficando de vez. Já são 28 anos.
Hoje ela é diretora de extensão das Faculdades Pequeno Príncipe. “Nestes muitos anos, aprendi a olhar as crianças com saúde e não só doença”. Um acontecimento, no entanto, marcou a memória dela. “Até metade da década de 1980, as crianças ficavam sozinhas, sem os pais, para o tratamento. Aquilo me indignou. Uma criança me fez mudar tudo”, afirma.
Tatiana lembra que certo dia topou com uma menina de seis anos chorando em uma escada. Estava internada há 30 dias para um tratamento de alongamento dos membros inferiores. Ao indagar os motivos das lágrimas, a crianças respondeu: “Minha mãe foi comprar um chocolate e disse que ia voltar”. Tatiana sabia que não. “Levei a menina para seu leito e prometi que a mãe ia voltar no dia seguinte. Ela então me disse que ia esperar no mesmo lugar, na mesma escada. Eu não sabia se ia mesmo acontecer, mas no outro dia a mãe voltou, para a visita. Aquela menina disse que eu tinha dito a verdade, que a mãe voltara. Eu podia ver a alegria em seu rosto”, conta.
O caso mudou o atendimento no Pequeno Príncipe. Tatiana criou o projeto Família Participante, em 1986. A partir dessa data, os pais passaram a acompanhar as crianças no tratamento. De acordo com ela, o tempo médio de tratamento diminuiu de 17 para três dias. “Isso mudou a cultura da instituição. Pudemos trazer mais alegria e diminuir os efeitos da hospitalização”.
Longe de casa – Esta alegria é sentida pela paciente Eduarda Júlia Sérgio Magalhães, de nove anos. Acompanhada da mãe, Sandra Maria Sérgio, Eduarda veio de Rondônia para se tratar no Pequeno Príncipe. Estão em Curitiba há dois meses para investigar um problema genético ainda não diagnosticado. Mas Sandra já sente a diferença. “Já passamos por diversos médicos e hospitais, ninguém queria o caso. Soube que o Pequeno Príncipe era referência. Viemos com a cara e a coragem. Aqui encontramos todo o apoio necessário”, relata.
Hospedadas na casa de apoio da instituição, têm toda a estrutura para o tratamento de Eduarda. “Temos médicos de seis especialidades acompanhando-a, quarto, comida, tem até chocolate”, conta Sandra. “Mas a médica disse para comer só um pouquinho”, emenda a pequena, um pouco tímida. Com saudades de casa, Eduarda diz que “aqui é legal...”.
Lição – O médico Eurípides Ferreira tem 79 anos e está no Pequeno Príncipe desde a década de 1960. É chefe do setor de transplantes de medula óssea. Foi o responsável pelo primeiro transplante de medula da América Latina. “Era dia 15 de outubro de 1979. Isso é marcante”, diz. “Mas há 50 anos, os recursos para tratamento de leucemia eram escassos, quase inexistentes. Nessa época, uma criança me deu uma lição de vida”, relembra. “Era 1961, 1962. Uma criança de mais ou menos seis anos estava muito doente. Ela me disse: ‘tio, você pode me fazer um favor? Você pode me deixar morrer em paz?’. A partir desse dia decidi trabalhar cada dia da minha vida para conseguir curar as crianças. Hoje, temos sucesso em mais de 80% dos casos”, relata Eurípides, dono de muitas histórias que se confundem com a do Hospital Pequeno Príncipe.
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