Pandemia deverá agravar casos de doenças mentais, em especial, os casos de suicídio, alertam especialistas Profissionais da área de saúde mental, do Ministério Público e da segurança pública debateram tema, considerado um desafio, em uma audiência pública remota nesta sexta-feira (25).

25/09/2020 21h59 | por Claudia Ribeiro
Políticas públicas frente à prevenção do suicídio foram debatidas em audiência pública.

Políticas públicas frente à prevenção do suicídio foram debatidas em audiência pública.Créditos: Reprodução

Políticas públicas frente à prevenção do suicídio foram debatidas em audiência pública.

Atendendo a uma solicitação da Ong Decida Viver, o deputado Tadeu Veneri (PT), que preside a Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Paraná, reuniu especialistas preocupados com a situação da população, especialmente no pós-pandemia, na audiência pública remota “Viva em Constante Transformação: Políticas Públicas Frente à Prevenção do Suicídio”.

“Acho que o fato de estarmos no Setembro Amarelo, mês de prevenção ao suicídio, é o momento certo para ouvirmos o que os especialistas têm a nos dizer para podermos criar e melhorar as políticas no campo da prevenção e do acolhimento dos pacientes”, afirmou Veneri.

O deputado destacou uma proposta feita pela Comissão para a realização de um fórum permanente de discussão. “Saímos daqui honrados pelas falas de vocês e pelas presenças em plena sexta-feira à noite. O tema é espinhoso, carregado de preconceitos, mas necessário e estamos aqui para contribuir”.

Para a psicóloga Raquel Pinheiros Niehues Antoniassi, que também é professora universitária, o suicido é uma verdadeira epidemia. Alegou que queria provocar incômodo, porque há um ano havia falado sobre o tema é de lá para cá, a situação não avançou nas políticas públicas de combate ao suicídio, como acontece com a dengue, por exemplo.

“Por isso, o problema persiste e ainda cresce.  Em Maringá, onde eu atuo, foram 943 tentativas de suicido em 2019 e 28 mortes. Até quando vamos conviver com isso?  E o pior. O mês onde mais ocorreram mortes foi em setembro, justamente quando se intensificam as ações. Acredito que essas ações não estejam sendo feitas de forma correta”, provocou.

A especialista também ressaltou que é preciso investir tempo e as políticas, segundo ela, devem promover acertos e não, erros. “Agir antes que o suicídio aconteça”, avisou

O suicídio é a causa da morte de uma pessoa a cada 40 segundos no mundo, de acordo com dados da Organização Mundial de Saúde (OMS). Hellem Luciana Damrat Tchaikovski, enfermeira especialista em saúde mental, com atuação no Hospital Adauto Botelho e no SAMU Curitiba, fez um relato histórico do suicídio, ao longo dos anos, do ponto de vista econômico e do religioso, explicando que passou a ser enquadrado como doença no fim da década de 1960. Apontou as perdas como principais gatilhos, agravados com a pandemia. 

Ela avalia o que falta para um melhor atendimento: a capacitação de profissionais na rede pública; de uma escuta qualificada; identificar como anda a saúde mental das pessoas; a presença de assistentes sociais e psicólogos nas escolas; acesso facilitado aos tratamentos; notificações e mais pontos de apoio. “Também gostaria de perguntar: como o estado do Paraná se insere na política nacional de prevenção se tem medo de falar em suicídio?”, questionou.

Flávia Caroline Figel, psicóloga do Departamento de Saúde Mental da Secretaria de Saúde do Paraná, se prontificou a responder e relatar um pouco da situação do estado. Disse que suicídio é um grande problema de saúde pública, que vem crescendo com o passar dos anos. “Para se ter uma ideia, o Paraná teve 927 suicídios em 2019 e a faixa etária é de pessoas de 20 a 29 anos. Em 2018, foram 918 casos e em 2015, pouco mais de 700. Então há uma alta preocupante com os casos”, disse.

Flávia explicou ainda que o Governo ministra cursos de capacitação a distância com os profissionais de saúde e de toda a rede, incluindo educação e segurança e para profissionais que lidam com a população indígena. “São abordados sinais, fatores de alerta e atualmente são 19 mil alunos realizando esse curso. É a preocupação da Secretaria a implantação das ações o ano todo. E melhorar o conhecimento técnico dos profissionais para que eles consigam compreender a situação”, afirmou.

O procurador do Ministério Público, Marco Antônio Teixeira, preferiu abordar o suicídio de outra forma: “como uma epidemia subterrânea”. E foi o primeiro a relacionar a pandemia de covid associada à epidemia das doenças mentais, que, de acordo com ele, vai durar muito mais tempo que a pandemia. “Não se sabe o quanto esse estresse em que o mundo vive, vai provocar. Será que a rede será suficiente? Claro que não”, relatou.

O MP se junta aos profissionais para que se defina o que será feito. Já foram feitos dois estudos: um no Reino Unido e outro no Japão. Por lá, já se tem consciência de que há falta de profissionais e de instituições para tratar os doentes. O internamento domiciliar já é realidade na Europa, mas o Brasil ainda é iniciante.

Ele frisou também que campanhas de prevenção ao suicídio devem ser permanentes. “Todos os meses têm que ser amarelos”.

Os profissionais lembraram que o suicídio é um estigma social, o que representa uma barreira para as pessoas superarem as fases mais agudas do seu tratamento.

“No MP desenvolvemos, e hoje com mais ênfase, a atuação primária. Começando nos municípios. Temos um programa relacionado ao uso de agrotóxicos em conjunto com a SESA, e estudando em campo para identificar as fraturas em municípios com alto índice de internamentos. Este em parceria com a UFPR”, pontuou Teixeira.

Heloísa Cella, servidora da saúde de Maringá, fez um retrato do que ocorre no município do Norte paranaense. Ela classificou o tema como “um grande desafio para nós, profissionais de saúde. Mas em Maringá, nas 34 unidades básicas de saúde temos psicólogos. Já fizemos capacitação, não apenas com esses profissionais, mas com toda a rede. No entanto, ainda há dificuldades em lidar com essa situação, com esse paciente. Precisamos intensificar essas ações. A porta de entrada deveria ser na atenção básica”.

Antes de ser um problema de saúde pública, o suicídio deve ser tratado como segurança pública, é o que acredita o tenente Pedro Gonçalves Seki, do 5º Grupamento de Bombeiros de Maringá, pelo fato dos bombeiros atuarem com o paciente pós tentativa de suicídio. “Claro que a prevenção é uma preocupação para nós, porque muitos que tentam o suicídio uma primeira vez, voltam a tentar. Em 2011 a PM doutrinou os agentes promovendo cursos para o atendimento. Mas os cursos para os bombeiros ocorreram apenas a partir de 2017. O número de bombeiros é pequeno para atender: são apenas 50 capacitados. É preciso investir mais nessa capacitação “, destacou.

Coronel Ademar Carlos Paschoal, comandante do 4º Batalhão de Polícia Militar do Paraná, fez um panorama com o olhar nos policiais que acabam se tornando pacientes. “Eles têm longas jornadas de trabalho, condições não ideais de trabalho e o risco de vida que se corre no dia a dia.  Também são suscetíveis a desenvolverem doenças mentais: crises de depressão, ansiedade e muitos ficam doentes”.

Em parceria com a ONG Decida Viver, o comando tomou providências com cursos nas universidades: Unicesumar e Universidade Estadual de Maringá. O objetivo, segundo o comandante, é identificar os policiais e investir em sua qualidade de vida. “Desde 2014, temos psicólogos para que cada batalhão possa avaliar os nossos policiais e estamos investindo em prática de meditação para redução da ansiedade”, disse. Ele apresentou resultados positivos da percepção dos policiais e de suas famílias após os processos.

Regina Aparecida de Paula, professora e presidente da ONG Decida Viver, começou a fala dela com a frase “Entendemos a vida como direito em sua plenitude”.  Ela contou que em 2017, perdeu um filho por suicídio.  Fundou a ONG para que outras famílias não vivam o luto como ela viveu. “Não me canso de dizer e reafirmar a vontade de viver. Hoje somos mais de 200 voluntários. Não somos salvadores da humanidade, mas queremos contribuir para o acolhimento das pessoas com intenções suicidas. Já acolhemos mais de 300 pessoas. Somos 43 psicólogos, mas a responsabilidade de cuidar da população é dos gestores públicos. É preciso criar condições para garantir o acesso à saúde, começando pelas prefeituras”, pediu. Para ela, há muita teoria e pouca prática. “Todos estão falando o que estão fazendo, mas os casos só aumentam ano a ano. Quem cuida deve ser cuidado. Vida tem que ser maior que a burocracia. Quem está desejando a morte não espera. Precisamos correr contra o tempo após a covid. Queremos somar forças. Pedimos apenas um olhar sensível a essa causa. Que todos se envolvam. Se eu tivesse mais conhecimento, talvez eu soubesse ter lidado com a situação e não tivesse perdido meu filho”, desabafou.

Com uma fala carregada de emoção, Tatiane Iori Alvim, psicóloga e coordenadora da Ong Decida Vive, que atua diretamente no trabalho de prevenção ao suicídio, reforçou a ausência de ações práticas quando se trata do tema. Ela destacou números da Organização Mundial da Saúde (OMS), que dão conta que entre seis a dez pessoas são impactadas por um suicídio. Ela também relatou as dificuldades que os profissionais têm no acesso aos seus pacientes quando eles são internados. “Nós da psicologia, não podemos ter acesso aos nossos pacientes nos hospitais. Temos que vê-los como visitantes por não sermos parentes, mas muitos deles não contam com nenhum familiar para apoiá-los”.

Setembro Amarelo - Desde 2014, a Associação Brasileira de Psiquiatria – ABP, em parceria com o Conselho Federal de Medicina – CFM, organiza nacionalmente o Setembro Amarelo. O dia 10 deste mês é, oficialmente, o Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio, mas a campanha acontece durante todo o ano.

São registrados cerca de 12 mil suicídios todos os anos no Brasil e mais de 1 milhão no mundo. Trata-se de uma triste realidade, que registra cada vez mais casos, principalmente entre os jovens. Cerca de 96,8% dos casos de suicídio estavam relacionados a transtornos mentais. Em primeiro lugar está a depressão, seguida do transtorno bipolar e abuso de substâncias.

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