
O novo Plano Nacional de Educação (PNE), que vigorará entre 2026 e 2036, deve trazer como um dos temas o combate ao racismo no ambiente escolar. A proposta está em discussão no Congresso Nacional e foi tema de audiência pública, nesta segunda-feira (1º), na Assembleia Legislativa do Paraná. O encontro, realizado no Auditório Legislativo, foi organizado pelo deputado estadual Professor Lemos (PT) e pela deputada federal Carol Dartora (PT) e teve como objetivo debater o Caderno PNE Antirracista.
“Nós estamos construindo o novo Plano Nacional de Educação e, dentro dele, queremos que a diversidade racial e étnica seja incluída, respeitada e valorizada em todas as etapas da educação, desde a infância até o ensino superior. O plano precisa ser antirracista”, afirmou o deputado Professor Lemos (PT). Segundo ele, a intenção é garantir condições para que estudantes negros e indígenas ingressem, permaneçam e concluam os estudos com sucesso, em igualdade de oportunidades. “É preciso combater a discriminação e eliminar o racismo, que ainda assola a sociedade brasileira”, completou.
O Caderno PNE Antirracista é um documento lançado pela Frente Parlamentar Mista Antirracismo para propor diretrizes e ações a serem incorporadas ao PNE. Foi construído a partir de mais de 400 propostas de todo o país e tem como objetivo combater o racismo estrutural, promover a equidade racial e valorizar a população negra no sistema educacional. A publicação reúne contribuições de diversas fontes, como movimentos negros e quilombolas, e foca em ampliar o acesso e a permanência de estudantes negros, além de garantir uma educação que considere a diversidade, valorize saberes africanos e afro-brasileiros e invista na capacitação de educadores para enfrentar o racismo estrutural.
Combate ao racismo nas escolas
Vice-coordenadora da Frente Parlamentar Antirracista na Câmara dos Deputados, a deputada federal Carol Dartora (PT) reforçou sua responsabilidade na condução do debate em nível nacional. “Tenho o compromisso de seguir nessa luta para que a educação brasileira seja, de fato, antirracista. Estamos reformulando o Plano Nacional de Educação e reconhecemos a necessidade de combater o racismo nas escolas. Essa ação é crucial para garantir uma educação de qualidade, uma educação pública que abranja a diversidade do nosso país. O racismo não pode mais ser um fator de sofrimento para crianças negras nas escolas”, afirmou a deputada.
Como membro da Comissão de Educação da Câmara e da Comissão Especial que analisa o PNE, a deputada explicou que as propostas foram construídas inicialmente por meio de diálogos com a sociedade civil e outras entidades e que, agora, há um espaço de escuta para o Paraná, com o objetivo de receber novas sugestões. “Ainda há a possibilidade de apresentar emendas”, destacou.
A deputada também citou alguns desafios para a efetivação do PNE, como questões orçamentárias, o financiamento da educação, a infraestrutura das escolas e a análise das especificidades regionais e territoriais.
Desafios e pontos críticos
Integrante da Comissão Especial que analisa o plano decenal de educação, o deputado federal Tadeu Veneri (PT) destacou que o PNE tem ambições consideráveis em termos de implementação, já que o plano anterior — o terceiro em vigência — enfrentou desafios significativos para cumprir suas metas. As dificuldades foram, em parte, decorrentes da pandemia e da insuficiência de recursos. “Por exemplo, em relação à educação infantil, alcançamos cerca de 60% da meta, com 600 mil crianças fora das creches. Além disso, não dispusemos de recursos suficientes para as universidades, finalizando o plano com um orçamento equivalente ao de 2014, ou seja, de dez anos atrás”, explicou.
De acordo com ele, outro ponto crítico é a evasão escolar. Até o ano passado, 480 mil alunos do ensino médio deixaram a escola antes de concluir o ciclo. “O plano é uma ferramenta essencial, mas também é alvo de disputas políticas. Alguns parlamentares e especialistas defendem uma educação mais competitiva, com ranqueamento entre escolas, o que preocupa, porque a educação deve priorizar inclusão e equidade”, afirmou.
Para o deputado, também é fundamental analisar o PNE em paralelo com a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 32, que trata da reforma administrativa. A PEC, entre outras medidas, prevê a contratação temporária por cinco anos, com cadastro nacional. “A implementação dessa medida comprometeria o funcionamento do plano, especialmente com a rotatividade dos profissionais a cada cinco anos”, pontuou. Segundo ele, a previsão é de que o plano seja votado em outubro, mas é essencial incluir o combate ao racismo. “A dimensão do racismo no Brasil é maior do que aparenta, e é preciso combatê-lo de forma eficaz, evitando a secundarização dessa questão”, afirmou.
Primeiro passo
Para a coordenadora do Núcleo de Promoção da Igualdade Étnico-Racial (Nupier) da Defensoria Pública do Paraná (DPE-PR), Camille Vieira da Costa, o lançamento do caderno antirracista é um passo essencial para consolidar políticas de combate ao racismo no sistema educacional. “É uma pauta construída com a sociedade civil e que precisa ser efetivada. A Lei Federal nº 10.639/2003, que trata do ensino da história e da cultura afro-brasileira, ainda não foi implementada de forma correta, e nós precisamos enfrentar essa realidade”, afirmou.
Segundo ela, a Defensoria Pública do Estado do Paraná pretende atuar na fiscalização e monitoramento das propostas apresentadas. “Queremos garantir que aquilo que está nesse caderno seja realmente aplicado, tanto na rede pública quanto na privada. O enfrentamento ao racismo deve ser amplo”, destacou. Camille reforçou ainda que a discussão não deve se restringir apenas a grupos específicos. “Essa pauta precisa ser debatida por pessoas negras e também por pessoas brancas. Não podemos ficar em uma bolha. Precisamos ampliar o diálogo para que a educação antirracista seja uma realidade inclusiva e transformadora em toda a sociedade”, completou.
Para a secretária de Promoção da Igualdade Racial e Combate ao Racismo da APP-Sindicato, Celina do Carmo da Silva Wotcoski, o PNE será fundamental para consolidar uma educação antirracista nas escolas paranaenses e brasileiras. “Esse não é o primeiro passo, mas a continuidade de uma luta que já foi iniciada antes de nós. O PNE é essencial porque vem ao encontro de tudo o que já construímos no Paraná em defesa de uma educação antirracista”, afirmou.
Ela lembrou que muitas leis já asseguram o ensino da história e da cultura afro-brasileira e indígena, como a Lei Federal nº 10.639/2003, mas ainda enfrentam dificuldades de aplicação prática. “As leis estão postas, mas não estão efetivadas de fato. Nossas equipes multidisciplinares muitas vezes não funcionam, e é preciso que o plano ajude a consolidar essas garantias nas escolas”, disse. Para ela, o papel dos educadores é central nesse processo. “Nós, professores e professoras, precisamos de formação para multiplicar esse conhecimento com os nossos estudantes. Afinal, são eles que sairão das escolas e vão construir uma sociedade antirracista”, completou.
Participantes
Também participaram do debate o presidente da Federação das Associações de Pais, Mestres e Funcionários das Escolas Públicas do Paraná (Fepamef-PR), Paulo César Ferreira; a vice-presidente da União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação (Uncme) Região Sul e coordenadora-geral da Uncme Paraná, Ana Lúcia Rodrigues; representando a Comissão de Igualdade Racial da OAB-PR, Bárbara Abdulmassih; o reitor da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), Everton Lozano; a vice-reitora da UTFPR, Vanessa Ishikawa Rasoto; representando a Pró-Reitoria de Ações Afirmativas e Equidade (Proafe/UFPR), Romilda Aparecida da Silva; o doutor em Ciências Sociais e integrante do Núcleo de Estudos Afros-Brasileiros e Indígenas (Neabi) do IFPR Campo Largo, Jorge Amílcar de Castro Santana; o professor de Linguística, Psicanálise e Educação das Relações Étnico-Raciais, Walker Douglas Pincerati; representando a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Mário Sérgio Ferreira de Souza; representando a deputada federal Leandre Dal Ponte (PSD), Clemilda Santiago Neto; a professora da UTFPR, Sílvia Amélia Bim; a assessora da Comissão de Igualdade Racial da Assembleia, Milena Santana; e a secretária de Mobilização e Movimentos Sociais da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Janeslei Aparecida Albuquerque.
AUDIÊNCIA PÚBLICA DE LANÇAMENTO DO CADERNO DO PNE ANTIRRACISTA 2026-2036
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